Activision Blizzard é processada por assédio e abuso sexual, discriminação e má conduta

A Activision Blizzard – responsável por grandes títulos como World of Warcraft, Overwatch e Call of Duty – foi processada pelo estado da Califórnia, nos EUA, por manter uma cultura completamente misógina dentro de seus estúdios.
A informação foi divulgada na manhã desta quinta-feira pelo jornalista Jason Schreier. Dentre as acusações que a empresa responderá, estão assédio sexual à funcionárias, diferenças salariais para a mesma função entre homens e mulheres e constantes retaliações a trabalhadores – sobretudo, as mulheres.

O texto do processo até cita o caso de uma funcionária da empresa que tirou a própria vida. A Activision Blizzard nega todas as acusações.

A ação foi apresentada pelo Departamento de Emprego e Habitação Justos da Califórnia (DFEH), ao Tribunal Superior de Los Angeles no último dia 20 de julho. As investigações que resultaram na abertura o processo ocorrem desde 2018. Ainda segundo o documento, executivos da empresa tinham conhecimento sobre os abusos e até tiveram envolvimento direto nas ações.

ATENÇÃO: OS TRECHOS A SEGUIR POSSUEM GATILHOS DE ASSÉDIO SEXUAL, RACISMO, ESTUPRO E SUICÍDIO.

De acordo com o processo enviado para o Tribunal de Los Angeles, a Activision Blizzard praticava o chaado “frat boy”, uma prática muito comum em fraternidades universitárias nos Estados Unidos, em que um grupo de garotos aluga uma casa para não precisarem morar dentro do campus da universidade e, consequentemente, submeter-se às regras da instituição.

Algumas funcionárias relataram o que chamam de “cube crawls”, que consiste nos homens ingerirem altas doses de bebida alcoólica até o ponto de literalmente rastejarem até as baias de trabalho das colegas mulheres e cometerem “atos inadequados” contra elas.

Elas também informaram que a remuneração paga para os funcionários homens era muito mais altas que as delas e todas as promoções de cargos que ocorriam, eram dadas apenas aos empregados “com a mesma experiência ou qualificação, mas que tinham amizade com os chefes”.

Cher Scarlett, ex-engenheira de software na Activision Blizzard, utilizou seu Twitter para contar um pouco de sua experiência dentro da empresa. Trabalhando por 6 anos lá dentro, ela era vista como “apenas uma designer, não uma engenheira de software”, sendo indicada para um cargo de design, que ela mesmo ressaltou “não ter experiência profissional, a não ser como freelance”.

A ex-funcionária ainda conta que na época, não teve a oportunidade de fazer um teste em linguagens de programação, por que sua transferência foi imediata e “sem motivo algum”.

Salários de funcionários homens e mulheres da Activision Blizzard possuem grandes diferenças, segundo investigação – Foto: Reprodução.

Em outro trecho, foi divulgado que “um supervisor recém-promovido delegou suas atribuições a um grupo de funcionárias novatas para que ele pudesse ficar jogando Call of Duty durante o trabalho”, enquanto isso, “outros se recusaram a se comunicar com as mulheres, preferindo se dirigir aos colegas homens, para tirar dúvidas ou pedir informações”.

Dentre todos os casos reportados pelo processo, o mais chocante é o de uma funcionária que tirou sua própria vida em uma viagem a trabalho com seu supervisor. De acordo com a a polícia, esse supervisor havia levado para a viagem “um brinquedo sexual e lubrificante”. A vítima também havia sofrido assédio dos colegas antes de sua morte. Ela teve fotos íntimas vazadas e compartilhadas entre colegas homens na empresa.

Uma parte do documento aponta que as funcionárias mães recebiam feedbacks negativos por estarem cumprindo o período de licença-maternidade ou saírem do expediente para buscar seus filhos na creche.

Os supervisores ignoravam as restrições médicas dadas às funcionárias e lhes deram avaliações negativas enquanto estavam em licença-maternidade. Outras funcionárias relataram que foram criticadas por saírem para buscar seus filhos na creche, enquanto seus colegas homens ficavam jogando videogame.
Funcionárias foram expulsas da sala de amamentação para que o espaço fosse usado para reuniões”.

Acusações de racismo contra funcionárias negras também aparecem no processo. Entre os casos, está o de uma funcionária que demorou dois anos para ter um contrato de trabalho fixo na empresa. Enquanto isso, funcionários homens que eram recém-chegados, já eram contratados de imediato. Ela relatou também que seu chefe “ligava constantemente pra saber se ela tinha saído para caminhar ou tinha feito uma pausa no trabalho”, mesmo com os demais funcionários homens jogando videogame durante suas jornadas de trabalho.

Outra funcionária negra também relatou algo surpreendente. Ela atua no setor de Tecnologia da Informação (T.I) da empresa solicitou ao seu superior uma folga programada. Ela teve que redigir uma página, detalhando “como iria gastar o seu tempo livre”, sendo que o mesmo não foi solicitado a outros funcionários.

O governo do estado da Califórnia alega que “a Activision Blizzard falhou em tomar as medidas razoáveis para prevenir discriminação, assédio ou retaliações ilegais”. A abertura do processo busca uma liminar que force a empresa a cumprir as leis de proteção do trabalho, além de realizar ajustes salariais e colocar em dia todos os salários e benefícios não pagos ou atrasados.

O que a Activision Blizzard disse sobre o caso

Após as denúncias virem à tona, a empresa emitiu uma nota ao site The Verge e outros portais internacionais, alegando que as acusações feitas pelo DFEH são “distorcidas” e, em muitos casos, falsas. De acordo com o comunicado, a empresa diz que foram realizadas “mudanças significativas para direcionar a cultura da empresa e refletir mais diversidade em nossas equipes de liderança”.

Atualizamos nosso Código de Conduta para enfatizar um foco estrito de não retaliação. Ampliamos programas e canais internos para que nossos funcionários possam relatar violações, incluindo a “Lista ASK” como uma linha direta e confidencial, e contratamos uma equipe de Relações com Funcionários dedicada a investigar as preocupações dos funcionários […] Os funcionários também devem passar por treinamento contra assédios regularmente.

A empresa também disse estar “enojada” pelo processo citar o suicídio de uma funcionária, que segundo eles, “não tem relação com o caso e não há qualquer consideração por sua família em luto”.

A Activision Blizzard considerou que “embora este comportamento vergonhoso e pouco profissional, infelizmente é um exemplo de como eles se comportaram no decorrer da investigação. É esse tipo de comportamento irresponsável de burocratas estaduais que está expulsando muitos dos melhores negócios da Califórnia”, num claro ataque direto ao andamento e a coordenação das investigações.

Fonte: O Setor 7 / Canaltech